22 de janeiro de 2017

Um sopro de vida

E foi ali no leito da morte que vi uma das mais ternas despedidas de amor.
"- Adeus meu amor! Descansa em paz!"
Disse aquela senhora velhinha, enrugada, com a pele que demonstrava a dor e o peso dos anos que carregava. Podia ver-se ali que a vida não havia sido branda com ela...
Beijou ternamente o seu amor que agora era só corpo sem alma.
Podia sentir-se como aquele corpo estava frio, carregava o gelo da morte, ainda que sereno e em paz.
Dei por mim ali a assistir a uma despedida eterna, ou pelo menos terrena e foi inevitável não pensar no amor.
Era a dor de amar que ali era invocada.
Será que algum dia eu ia querer viver aquilo?!
As lágrimas preencheram-me os olhos de comoção, mas não caíram, não era momento de chamar as minhas dores.
Aquele casal separava-se ali, não pelas leis dos homens mas pela lei da vida.
Mais de 50 anos de casamento, de amor, filhos, discussões, lamentos, companheirismo, de paciência, de dedicação... e agora num sopro tudo se foi... assim... um fica o outro vai.
Oh seria algum dia eu capaz de ter tudo aquilo? 50 anos de casada? Não... já vou demasiado atrasada... a morte deve apanhar-me antes disso.
Mas e o resto?!
Aquele amor dos antigos, onde não se questiona se algum dia terá um fim, onde a palavra separação não tem lugar... onde se engolem muitas coisas para disfrutar de muitas outras?!
Ali eu questionei se valia a pena?! 
Se era para acabar assim, será que todo o esforço valeu a pena??
Quis perguntar-lhes isso mesmo, mas a um deles era impossível porque a sua alma era agora de Deus, ao outro... não era meu direito perfurar desse modo uma dor dilacerante que se fazia sentir só de olhar.
Restou imaginar...
Mas algo me disse que em muitos dos rostos que ali se despediam haveria sempre uma restia daquele amor que fazia com que tudo aquilo tivesse valido a pena.

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